Perspectivas sobre futura arbitragem tributária brasileira

Análise de controvérsias atuais, cuja solução possa ser efetiva para a instituição de uma arbitragem tributária brasileira

Nos anos recentes, muitas foram as discussões acerca da implementação de uma arbitragem tributária brasileira no âmbito do Núcleo de Direito Tributário do Mestrado Profissional da FGV Direito SP. Se o debate em torno desse método alternativo de solução de conflitos fiscais, é bem verdade, permaneceu por tempos adormecido, a coleção de artigos publicados aqui no Jota é prova de que o cenário mudou e que o tema efervesce nos grupos que se dedicam ao estudo do Direito Tributário e das políticas fiscais nacionais.

Como abordado nesse espaço, o estigma da indisponibilidade do crédito tributário, que até tempos recentes dominava as mesas de debate que se debruçavam sobre eventual arbitragem tributária no Brasil, já parece superado e não deve ser tomado como empecilho para a introdução do instituto em nosso ordenamento. De fato, já não é mais essa a controvérsia que se põe no centro das discussões acerca da sua aplicação no âmbito fiscal.

As questões agora postas são outras e não de menor complexidade: qual o veículo normativo próprio para a introdução da arbitragem tributária em nosso ordenamento?[1] Que matérias são arbitráveis?[2] Em que contornos deverá tal arbitragem se desenvolver?[3] Em que locais?[4] Qual a amplitude dos efeitos de suas decisões?[5] Em que extensão a sentença arbitral estará sujeita ao controle judicial?[6] Essas questões – tais quais as tantas outras tratadas nessa série de artigos – merecem amplo escrutínio, a inspirar em ambos Estado e contribuinte a confiança necessária para o êxito do instituto em nosso país. Isso o que aqui se pretendeu: lançar à discussão controvérsias atuais e relevantes, cuja solução possa ser efetiva para a instituição de uma arbitragem tributária brasileira.

Como visto, a urgência da recuperação de créditos fiscais pela Fazenda Pública e as conhecidas morosidade e ineficácia das tradicionais medidas de soluções de litígios, aliadas à possibilidade de se conferir ao contribuinte nova alternativa para a solução de seus conflitos (introduzindo-se verdadeiro sistema de tutela multiportas), tornam necessário que o tema seja posto no centro do debate público de nossas políticas fiscais e jurisdicionais.

Com efeito, cremos que estamos diante de ambiente institucional favorável à introdução da arbitragem tributária brasileira, especialmente após a edição da Lei nº 13.129/2015, que alterou a Lei nº 9.307/1996 – mais conhecida como Lei de Arbitragem – e previu a sua utilização pela Administração Pública para a solução dos litígios em que se veja envolvida.

Aliás, se os movimentos Fazendários na busca de racionalidade para a solução de controvérsias tributárias são muitos e observados em todos os níveis da Federação[7], também o próprio Judiciário tem incentivado a adoção de métodos alternativos de resolução de litígios[8] a fim de aliviar o congestionamento dos Tribunais, assoberbados pela excessiva judicialização de disputas, que já nos parece cultural.

Aliás, as diversas e recentes normas editadas para a instituição da transação tributária[9], desejavelmente aperfeiçoadas no contexto atual de crise provocada pela pandemia do COVID-19[10], são sintomáticas dos anseios da sociedade relativos à adoção de métodos alternativos que viabilizem a solução dos conflitos de maneira mais célere e eficaz.

De fato, nossos estudos sempre tiveram a pioneira e bem sucedida experiência portuguesa de arbitragem tributária como paradigma a ser observado por quem quer que se debruce sobre o tema; contudo, também evidenciaram que as particularidades brasileiras reclamam a elaboração de arbitragem tributária verdadeiramente nacional, capaz de atendê-las todas por meio de um instituto que nos seja particular.

Por isso, tomamos como certo que a simples transposição ao nosso ordenamento de um sistema pronto de arbitragem tributária não seria o caminho mais adequado para atender nossas necessidades. E, se é assim, temos que as ideias lançadas nos mencionados artigos servem, ao menos, como norte à elaboração desse necessário novo modelo a ser desenvolvido.

É nesse contexto que, com bons olhos, enxergamos o citado Projeto de Lei nº 4.257/2019[11], que pretende instituir a arbitragem tributária no Brasil como alternativa à apreciação judicial de Embargos à Execução Fiscal, uma vez garantido o feito executivo. Se a iniciativa, tal como posta, é louvável, acreditamos que o instituto possa ser aperfeiçoado pelas sucintas considerações traçadas nos textos aqui publicados, alcançando voos mais altos.

Seja como for, algo nos parece evidente: se no início dos debates no âmbito da FGV a instituição de uma arbitragem tributária brasileira se mostrava distante, por ora nos parece que já tenha se tornado realidade próxima. Por certo, sua instituição é não só conveniente àqueles que a ela poderão se submeter e dela se aproveitar, mas instrumento a contribuir à concretude, também em matéria fiscal, da promessa de uma tutela efetiva e célere contida na Carta de 1988, ainda que fora das dependências do Judiciário. [1] Vide Qual seria o ato normativo adequado à introdução da arbitragem tributária no Brasil? (https://www.jota.info/opiniao-e-analise/colunas/pauta-fiscal/qual-seria-o-melhor-local-para-a-instauracao-de-um-tribunal-arbitral-no-brasil-02082019) [2] Vide Viabilidade da implementação da arbitragem tributária no Brasil. (https://www.jota.info/opiniao-e-analise/colunas/pauta-fiscal/viabilidade-da-implementacao-da-arbitragem-tributaria-no-brasil-05122019) [3] Vide Arbitragem tributária e o lançamento de ofício e A prestação de garantia no processo arbitral tributário; (https://www.jota.info/opiniao-e-analise/colunas/pauta-fiscal/arbitragem-tributaria-e-o-lancamento-de-oficio-18072019) [4] Vide Qual seria o melhor local para a instauração de um tribunal arbitral no Brasil? (https://www.jota.info/opiniao-e-analise/colunas/pauta-fiscal/qual-seria-o-melhor-local-para-a-instauracao-de-um-tribunal-arbitral-no-brasil-02082019) [5] Arbitragem Tributária poderia reconhecer indébito tributário e autorizar restituição? (https://www.jota.info/paywall?redirect_to=//www.jota.info/opiniao-e-analise/colunas/pauta-fiscal/arbitragem-tributaria-poderia-reconhecer-indebito-tributario-e-autorizar-restituicao-31102019) [6] Vide Reflexões sobre a judicialização da sentença arbitral em litígios tributários. (https://www.jota.info/opiniao-e-analise/colunas/pauta-fiscal/reflexoes-sobre-a-judicializacao-da-sentenca-arbitral-em-litigios-tributarios-16082019) [7] Vide São Paulo cria alternativas para a solução de controvérsias tributária. (https://www.jota.info/opiniao-e-analise/colunas/pauta-fiscal/sao-paulo-cria-alternativas-para-a-solucao-de-controversias-tributarias-26032020) [8] Como exposto também em Arbitragem Tributária poderia reconhecer indébito tributário e autorizar restituição? [9] Embora prevista há cerca de 50 (cinquenta) anos no Código Tributário Nacional, a transação em matéria tributária tornou-se uma realidade apenas recentemente com a edição da Lei nº 13.988/20 (resultado da conversão em Lei da Medida Provisória nº 899/2019). Em âmbito federal, diga-se, foram editadas as Portarias PGFN nº 9.917/2020, 9.924/2020, bem como a Portaria MF nº 247/2020, que regulamentaram os requisitos e procedimentos para os contribuintes transacionarem com a Fazenda Nacional. [10] Recentemente, foi editada a Portaria PGFN 14.402/2020, que estabeleceu a transação excepcional na cobrança da dívida ativa da União, em função dos efeitos da pandemia causada pelo coronavírus (COVID-19). [11] Abordado múltiplas vezes, mas especialmente em Arbitragem tributária brasileira está no forno. (https://www.jota.info/opiniao-e-analise/colunas/pauta-fiscal/arbitragem-tributaria-brasileira-09082019)

FABIO TARANDACH – associado de Pinheiro Neto Advogados.
MATEUS GRIPP – Mestrando em Direito Constitucional Tributário e Bacharel em Direito, ambos pela PUC-SP. Pós-graduado em Direito Tributário pela FGV Direito SP. Advogado do Mauler Advogados.

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