O que negativa de liminares diz sobre a posição de Moraes no caso do Difal?

No último dia 17 de maio, o ministro Alexandre de Moraes negou as liminares requeridas nas quatro ações diretas de inconstitucionalidade (ADIs) que discutem o momento a partir do qual deve ser cobrado o diferencial de alíquota (Difal) de ICMS, conforme disposto na Lei Complementar 190/22. Como resultado prático, a cobrança continua vigente até a análise do mérito das ações pelo plenário da Corte.

Mas o que a decisão do ministro Alexandre de Moraes diz sobre o mérito da causa? Ao negar as liminares ele aponta que votará contra a necessidade de ser observada tanto a noventena quanto a anualidade na cobrança do diferencial? Para tributaristas ouvidos pelo JOTA, a resposta é sim.

Há, porém, um ponto que não foi tratado no voto de Moraes, e que deverá constar no julgamento em plenário das ações sobre o Difal: o fato de a própria LC 190/22 fazer referência aos dispositivos que preveem a noventena e a anualidade. A peculiaridade faz com que tributaristas questionem inclusive a existência de inconstitucionalidade na norma, considerando que seria mais adequado ao STF conferir interpretação conforme a Constituição aos casos.

Quatro ADIs

São quatro ADIs em tramitação no Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o tema, propostas por unidades federativas (ADIs 7.070 e 7.078) e por entidades representantes dos contribuintes (7.066 e 7.075). O primeiro conjunto de ações foi ajuizado pelos estados do Ceará e Alagoas, que requerem que seja reconhecida a possibilidade de cobrança do Difal desde janeiro, quando foi publicada a LC 190. Nas outras duas ADIs os autores alegam que a aplicação do princípio da anterioridade permitiria a cobrança do diferencial apenas a partir de 2023.

Em relação ao pedido dos estados do Ceará e Alagoas nas ADIs, Moraes considerou no último dia 17 que não há perigo da demora até a análise do mérito da causa, o que justificaria a concessão da liminar. Isso porque já se passaram mais de 90 dias desde a edição da LC 190/22.

A maior polêmica está no entendimento relacionado às ADIs de representantes do setor produtivo. Uma delas, a ADI 7.075, proposta pelo Sindicato Nacional das Empresas Distribuidoras de Produtos Siderúrgicos (Sindiser), foi extinta sem resolução do mérito. Para o ministro, a entidade não teria legitimidade para propor a ação.

Em relação à ADI 7.066, ajuizada pela Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), Moraes negou a liminar por considerar que não está presente o chamado fumus boni iuris, ou seja, a fumaça do bom direito no pedido da entidade.

Isso porque, para o relator, a LC 190/22 não mudou a base de cálculo ou a incidência de tributos, não sendo necessária a observância do princípio constitucional da anualidade. “O Princípio da anterioridade previsto no art. 150, III, b, da CF, protege o contribuinte contra intromissões e avanços do Fisco sobre o patrimônio privado, o que não ocorre no caso em debate, pois trata-se de um tributo já existente (diferencial de alíquota de ICMS), sobre fato gerador antes já tributado (operações interestaduais destinadas a consumidor não contribuinte), por alíquota (final) inalterada, a ser pago pelo mesmo contribuinte, sem aumento do produto final arrecadado”, afirmou Moraes ao negar a liminar.

Ao JOTA, a secretária de Fazenda do Ceará, Fernanda Pacobahyba, afirmou que a posição do ministro já era conhecida, e não surpreendeu. “[Alexandre de Moraes], no próprio julgado que falava do Difal [ADI 5469 e do RE 128019], já tinha deixado clara essa questão de não acreditar na necessidade de anterioridade porque não haveria surpresa”, afirmou.

Para tributaristas ouvidos pelo JOTA, este é um caso em que é quase impossível analisar o pedido liminar sem entrar no mérito. Assim, Moraes adianta seu entendimento em relação ao momento de vigência do Difal do ICMS ao considerar que não se aplica ao caso concreto o princípio da anualidade.

Há, porém, um elemento que ainda não foi analisado pelo relator das ADIs: o fato de a própria LC 190/22 fazer referência à alínea c do inciso III do artigo 150 da Constituição. O dispositivo define a impossibilidade de cobrança de tributos antes de passados 90 dias da data de publicação da lei que os instituiu ou aumentou, fazendo referência, ainda, à alínea b do inciso III do artigo 150. O último dispositivo, por sua vez, trata do princípio da anualidade.

De acordo com tributaristas, por mais que já haja um posicionamento prévio do ministro Alexandre de Moraes em relação à necessidade de observância do princípio da anualidade no caso do Difal de ICMS, não há uma linha sobre o fato de o legislador ter feito questão de incluir, na LC 190, dispositivo que faz referência à noventena e à anualidade.

“A discussão não é se esta Lei Complementar [190/22] estaria obrigatoriamente sujeita à anterioridade. O legislador, por vontade própria, submeteu a lei à anterioridade”, afirmou o advogado Igor Mauler Santiago, sócio do Mauler Advogados. Para o tributarista, a Lei Complementar não é inconstitucional.

A advogada Ariane Guimarães, sócia do Mattos Filho Advogados, tem a mesma opinião. Para ela, não há vício de constitucionalidade na LC 190/22, mas a cobrança do Difal pelos estados deve observar o texto da lei. “Estamos diante da opção do legislador federal de fazer referência a um dispositivo constitucional que estabelece a anterioridade”, afirma.

Ainda não há data para que o mérito das ADIs seja julgado. Há, porém, um consenso de que quanto mais tempo para a definição do tema maior a insegurança jurídica em torno do momento de aplicação do Difal.

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